O BURRINHO
E. Barros de Aguiar
Há quem passe pela vida
Sem se lembrar de si
Numa existência convertida
Apenas em servir
Quem desse mal padece
De si próprio esquece
Como o burro de carga
Que em jornada larga
Não para e nem descansa
Dedicado aos favores alheios
Puro como uma criança
Sem medidas e nem receios
Pensa na família, nos parentes,
Nos irmãos, nos descendentes
Nos vizinhos, nos doentes
Nos pobres, nos dependentes
Em todos, menos nele mesmo
Come só se der e se puder
Se desgasta, dorme a esmo
Desse mundo nada quer
Como na história do burrinho
Que mesmo doentinho
Era explorado por seu dono
Que, sentado em seu trono
Nunca lhe dava descanso
Fazendo-o ir além do que podia
Forçando o animal manso
- Não pare! Trabalhe! - dizia.
Só a besta sabia o que sofria
No dia quente e na noite fria
Diante de tanto sofrimento
Alguém quis cessar o tormento
Daquele triste animal
Buscando uma autoridade
Que pusesse fim aquele mal
Procurou um outro frade
Que era o seu superior
Homem santo, de valor
Embora enfermo, moribundo
Tinha um amor profundo
Por toda a criação
Ele, tendo ouvido o relato
Propôs uma intervenção
Para tratar do fato
Junto ao dono do burrinho
Merecedor de carinho
E não de brutalidade
Nem de qualquer maldade
Foi quando o irmão Leão
Que era o nome do irmão
Que foi prestar a queixa
Aproveitou aquela deixa
Para dizer ao seu superior:
- Querido Pai Francisco
Esse Burrinho é o senhor!
Que sem avaliar o risco
Dedicou-se a vida inteira
Até a hora derradeira
A todos os necessitados
De teto, de pão, de cuidados
Descanse, meu Pai querido
Pois depois desta vida
Certamente será recebido
Pelo Senhor que o Convida
A estar com Ele no mais Alto Céu
Para além de todo véu
Do egoísmo humano
Que domina neste plano
Disse Francisco, bem baixinho
Passando a mão em seu peito
- Desculpe-me, meu burrinho
Por lhe tratar desse jeito.
Como perdoar tal pecador?
Que com tamanho amor
Ousou imitar o Mestre?
Passando no difícil teste
Da superação do egoísmo
Agindo com abnegação
Dedicação e altruísmo
Jamais sonegando a mão
A quem dela precisasse
Fazendo que Jesus brilhasse
Em cada lágrima enxugada
E em toda ferida tratada
Oh, Senhor, perdoai-os
A todos esses que são assim
Acolhei-os, abraçai-os
Digo por meus irmãos e por mim
Atendei a nossa prece
Mandai mais destes pecadores
É disso que este mundo carece
De mais burrinhos sofredores
SEM RESERVAS
E. Barros de Aguiar
Na vida faça o bem
Ajude, console
Perdoe também
Ame, cantarole
O campo florido
Pintado de cor
Em vivo esplendor
De amor ungido
É todo mantido
Pela Benção do Céu
Assim como nós
E as aves ao léu
Que o singelo trinar
Que se ouve na relva
E na densa selva
Te possa lembrar
Que deves andar
Como o mestre andou
Pois foi sem reservas
Que Ele te amou